Nem sempre os números de um balanço contam toda a história de uma empresa. Em muitas situações, o que atrai um investidor não é a posição contábil do momento, mas o potencial de recuperação, a operação ativa, a clientela consolidada, a sede em ponto estratégico, os contratos em vigor ou mesmo o reconhecimento de mercado por sua marca. Por isso, é perfeitamente possível — e comum — que uma empresa com patrimônio líquido negativo seja adquirida por um valor positivo, e quando isso acontece, o valor pago além do passivo a descoberto é registrado como ágio.

Quando a empresa adquirida apresenta patrimônio líquido negativo, é natural que surja a dúvida: por que alguém pagaria por uma estrutura com passivos maiores que os ativos? A resposta é simples — porque a empresa, apesar do seu desequilíbrio contábil, tem valor econômico, está em atividade, tem contratos ativos, clientela fiel, localização estratégica ou uma marca consolidada. O comprador reconhece isso e, por essa razão, realiza o pagamento — valor este que configura o ágio, representando um custo claro e direto para a empresa que investe.

Esse ágio não é uma ficção — é um desembolso efetivo, um custo arcado pela investidora para adquirir a empresa investida. E, como tal, deve ser tratado como custo fiscal legítimo, especialmente quando se tratar de apuração de ganho de capital ou de amortização no lucro real, e negar isso seria ignorar a própria natureza da operação e afrontar os fundamentos do sistema tributário, afinal, de acordo com o art. 43 [1] do Código Tributário Nacional, o imposto de renda só pode incidir sobre acréscimos patrimoniais. Se o contribuinte apenas pagou por algo — sem qualquer ganho no momento — não há o que tributar.

 

Esse entendimento encontra respaldo doutrinário nos ensinamentos de Schoueri, “se alguém paga um preço para receber algo, não tem qualquer ganho. Há mera troca. Daí que assegurar a dedução do ágio, no caso, é impedir que se ofereça à tributação ganho que não foi auferido”[2], sustentando-se também na visão de Bulhões Pedreira ao afirmar que “o ágio corresponde ao direito de a investidora receber os valores que não estão registrados na escrituração da controlada ou da coligada” [3]. Ou seja, o valor pago acima do PL não é gratuito — ele reflete ativos ocultos, intangíveis ou não mensurados, mas que justificam economicamente a transação.

Essa abordagem encontra eco nas práticas de valuation empresarial, em que ativos intangíveis frequentemente representam parcela relevante do valor de mercado.

Assim, o ágio — mesmo em hipóteses de patrimônio líquido negativo — mostra-se perfeitamente justificável, desde que a operação esteja devidamente estruturada e acompanhada da documentação técnica pertinente, como laudos de avaliação, estudos de rentabilidade e análises de sinergia capazes de demonstrar a vinculação do ágio à expectativa de rentabilidade futura, viabilizando, assim, sua amortização fiscal.

Dessa forma, não se trata de dizer que toda operação com ágio sobre PL negativo é automaticamente legítima — tampouco que é presumivelmente irregular. O ponto central é a análise da substância econômica da operação, e ocorrendo motivação negocial real e documentação idônea, o custo deve ser reconhecido.

Em resumo, se há pagamento efetivo, há custo incorrido — e custo incorrido é dedutível. O ágio, quando bem fundamentado, é expressão legítima do valor percebido em uma empresa, ainda que seus números contábeis não o revelem, e reconhecer isso não é ignorar o rigor fiscal, mas sim respeitar a racionalidade econômica que sustenta o próprio direito tributário.

Fonte: Contábeis


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